III

Penso que o Miguel ficou espantado com a minha frescura. Eu própria fiquei.
Achei que quando o visse teria uma recaída. Derramaria rios de lágrimas. Imploraria para que ele ficasse comigo. Julguei-me mal, julguei-me fraca, mas afinal de contas surpreendi-me. É bom quando isso acontece, quando nos surpreendemos a nós próprios, não?
O Miguel veio a correr atrás de mim, gritando pelo meu nome, implorando para que eu esperasse e falasse com ele. A minha vontade era de virar-me para trás e dizer: "Ó BURRO, AINDA NÃO PERCEBESTE? ACABOU!", mas achei que se o ignorasse ia fazê-lo sofrer e eu queria que isso acontecesse.
A voz do Miguel já falhava. A mim o que me falhava era o fôlego... Já não aguentava mais correr para "fugir" dele. Achei que ele se iria cansar, parar a meio do caminho, pousar as mãos sobre os joelhos, respirar apressadamente e dizer: "ok, desisto. Já vi que não vale a pena", mas eu também julguei muito mal o Miguel. Ele não era um desistente. Se assim fosse, não teria nada do que tem na vida. Foi ele que conquistou tudo e sozinho. O lugar na empresa, o apartamento, o carro... tudo. Ele lutou pata ter tudo e conseguiu.
Parei, já cansada. Virei-me para trás e iniciei um diálogo com o Miguel:
Eu: "Que foi, Miguel? Não desistes mesmo. Que persistente."
Miguel: "Nunca desisti do que quero, não ia começar agora..." (não vos disse?)
Eu: "Só assim por acaso, estás a dizer que me queres?"
Miguel: "Sim, estou. Não entendeste ainda?"
Eu: "A única coisa que entendi, é que quando foste para fora estávamos chateados. Ficámos com a relação mal acabada e tu apareceste com outra. Logo no café da minha melhor amiga... Não perdeste tempo. Nós até podíamos ter reatado. Foi uma discussão sem nexo, sem importância. Mas o que tu acabaste por fazer, foi por uma pedra sobre o assunto, foi dar a entender que eu não tinha importância alguma, entendes? Ó Miguel, não posso..." (O Miguel pôs-me o indicador sobre os lábios, impedindo que eu continuasse a falar)
Miguel: Entendo o que queres dizer, mas tu não entendeste ainda. Eu amo-te a ti, entendes? A ti. Eu conheci a Inês numa daquelas conferências aborrecidas e combinamos ir beber um copo depois. Pus-me a contar a nossa história. De como nos conhecemos e como acabamos por nos chatear. A Inês disse-me que o meu lugar era aqui, contigo. Tu é que percebeste tudo mal. E pensa comigo, se eu tivesse feito isso de que tu me acusas, achas que teria vindo justamente para aqui? Ter-te evitado seria a melhor solução..."
Eu: "Desculpas. Vieste para aqui, para te poupares a trabalhos e palavras. A Ana contou-me da caixa que tiraste do bolso para mostrares à Inês, viu-te a tocares nela. Magoas-me Miguel. Magoa-me ainda mais a tua mentira, do que a tua traição!"
Miguel: "Desculpa? Tu é que me magoas. Estás a acusar-me injustamente. Se eu me queria poupar a trabalhos, diz-me o porquê de estar aqui a dar-te justificações?! E a caixa... a caixa... era uma surpresa para ti e só estava  a mostrá-la à Inês para ela me dar a sua opinião. Tem sido um apoio nestes últimos dias. E passei-lhe a mão pela cara para ensaiar o que te queria dizer. E até te ia dizer para lhe perguntares se isto é verdade, mas ainda achavas que estávamos feitos um com o outro."
Eu: "Uma surpresa? Sabes que odeio surpresas Miguel. Pedias opinião à Ana, ou aos teus pais..."
Miguel: "Sim, eu sei. Mas era uma surpresa que ias gostar bastante, mas agora não vale a pena. E que fique bem claro que não estou a desistir de ti, nem de nós, mas apercebi-me que a surpresa afinal de contas era má ideia, porém ajudou-me a perceber que não confias em mim, sendo assim não podíamos ser marido e mulher."
Eu: "Marido e mulher?! Não me digas que a surpresa era..."
Miguel: "Dizes bem, era... Não posso ficar com uma pessoa que não confia em mim." (O Miguel vira as costas, lamentado tudo o que se tinha passado.)
Eu: "Espera, Miguel! Já não me amas?!"
Miguel: "Amo-te, mas também amo uma boa relação e todos os seus componentes. Sabes, por vezes amar não basta."
Eu: "Mas eu Amo-te mais que a mim mesma, pensei que isso chegasse para ficarmos juntos!" (gritei)
O Miguel começou a andar. Agora era ele quem fugia.

(continua...)

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